O Agosto Lilás, símbolo da luta pela igualdade de gênero, abre espaço para a reflexão sobre os avanços e os obstáculos que permeiam a jornada profissional das mulheres
Por: Fernanda Negreiros
Tudo na vida é como agimos e nos posicionamos diante da realidade. A questão das mulheres no mercado de trabalho e na liderança das organizações não é diferente. Estamos diante de muitos avanços nesse tema. E o movimento “Agosto Lilás” nos faz refletir sobre o crescimento constante e significativo da presença feminina no mundo jurídico. Segundo a pesquisa Women in Business da Grant Thornton, realizada em 2022, houve um aumento de 11% na proporção de mulheres em posições de liderança nos últimos dez anos, e atualmente elas ocupam 32% dos cargos de CEO nas empresas no Brasil. Apesar desses números positivos, as mulheres são minoria em muitas áreas no mercado de trabalho. Além disso, ainda é possível encontrar relatos e estudos que tratam da desistência de suas carreiras em razão das dificuldades enfrentadas. Segundo uma pesquisa realizada pela Mckinsey, em outubro de 2022, as mulheres estão desistindo de cargos de liderança por conta da carência de reconhecimento e do excesso de trabalho.
A contribuição das mulheres em seus âmbitos profissionais, em virtude de sua força e características é notória. Com base em uma pesquisa da organização Leadership Circle, que obteve a análise de mais de 84 mil líderes e 1,5 milhão de avaliadores, o historiador estadunidense Kevin Kruse escreveu um artigo para a Forbes, em abril de 2023, com conclusões que chamaram a minha atenção: as mulheres constroem e cultivam conexões mais fortes, têm mais cuidado com o desenvolvimento de outras pessoas e demonstram maior preocupação com a comunidade. Elas ainda praticam com maior facilidade a empatia e a resiliência (até por tudo que já passaram ao longo da história), estando mais atentas ao lado humano de cada um.
As diferenças no comportamento, na forma de agir e pensar impactam positivamente os resultados e tomadas de decisão. Eu acredito nisso e, aliás, vivi isso nos últimos anos. Foi preciso uma boa dose de paciência comigo mesma para vencer obstáculos, dificuldades e lutar pelo meu espaço. Aprendi a ter coragem para enfrentar meus medos e inseguranças, a buscarconstantemente a conciliação da vida pessoal com a vida profissional intensa e a aceitar a tal vulnerabilidade, trazida especialmente pela pesquisadora Brené Brown em sua palestra no TED, que já ganhou mais de 40 milhões de visualizações. Na ocasião, ela disse: “... eu sei que a vulnerabilidade é o centro da vergonha, do medo e da nossa luta por merecimento, mas parece também ser a origem da alegria, da criatividade, do pertencimento, do amor.”
Acredito que quando aceitamos nossa vulnerabilidade, conseguimos ser mais empáticas e reais. E isso nos fortalece. Uma vez que nos tornamos conscientes disso, aprendemos a superar as dificuldades, a nos arriscar, a enfrentar os medos e a reconhecer nossas fraquezas. Com isso, surgem oportunidades que só enxergamos se estivermos de coração aberto. Foi o que aconteceu comigo. Conheci homens e mulheres que aceitaram as minhas imperfeições, foram acolhedores e ajudaram no meu desenvolvimento. Esses profissionais contribuíram de forma substancial para o meu crescimento e posicionamento no ambiente de trabalho. Crescer e contribuir trazem realização pessoal e sentimento de pertencimento e de amor.
Aprendi a expor minhas opiniões, a discordar com gentileza e a tomar decisões que influenciaram outras pessoas e, muitas vezes, serviram de exemplo e inspiração para outras mulheres, dentro e fora do âmbito profissional. Com o incentivo dos meus pares e por meio do meu exemplo, conseguimos atuar para diminuir as desigualdades e a valorizar pessoas, independentemente de raça, sexo, cor, status social ou qualquer outra classificação.
Hoje, em nossa organização, temos 89% de mulheres, das quais 61% se autodeclaram negras. Além disso, a presença feminina também é maioria dentre as lideranças, representando 64% do total. A luta é constante e fundamental para despertar na sociedade a importância de uma cultura mais inclusiva. Olhar isso de uma maneira ampla pode parecer incipiente, pouco efetivo, mas acredito que é dentro do nosso âmbito profissional, social e familiar que cada mulher tem a possibilidade de trazer contribuição a essa necessária aceitação de que em muitas coisas homens e mulheres são diferentes e em muitas outras são iguais (na força de trabalho, inclusive).
Se de um lado temos muitos motivos para desistir, de outro encontramos forças para fazer a diferença e contribuir muito no mercado de trabalho. As mulheres podem ser o que quiserem, mas é preciso muita determinação, força e coragem para vencer o desânimo advindo dos obstáculos que enfrentam diariamente numa sociedade ainda muito machista.
Por isso, devemos assumir o protagonismo de nossas carreiras com persistência, a fim de vencer os desafios que aparecem ao longo desse caminho. Não é fácil. Cada uma de nós sabe disso. Enfrentamos as mais variadas dificuldades, fazemos renúncias e precisamos organizar o nosso tempo, diante das inúmeras atribuições de nossos papéis. Apesar das dificuldades, precisamos estar certas de que nossas habilidades e competências trazem muitos benefícios nos ambientes corporativos. E é essa a motivação dessa luta e desse enfrentamento.
Fernanda Negreiros, sócia, advogada.